Referência:
GENRO FILHO, Adelmo. Marxismo, filosofia profana. Porto Alegre, Tchê, 1986. pp. 49-80. [Ref.: T193]
Ecologismo e marxismo: Dois pesos e duas medidas

         Este texto pretende abordar dois aspectos da problemática ecológica. Em primeiro lugar, reafirmar a importância desse tema que, muito justamente, tem ocupado lugar de destaque nos debates políticos e filosóficos da atualidade. A ecologia é uma disciplina que, apesar da indefinição axiológica típica de um saber em formação, levanta questões incontornáveis. Como disse Enzensberger: "O nó da crise ecológica não pode ser cortado com uma espátula".(1) Em segundo lugar, propor algumas reflexões críticas sobre o "ecologismo", especialmente em sua versão "libertária" ou neo-anarquista.

         A discussão dos problemas em torno dos quais a ecologia gravita envolve, sem dúvida, uma série de disciplinas das ciências naturais e sociais, inclusive a própria filosofia. Mais de um século nos separam de 1868, quando o biologista alemão Ernest Haeckel, na sua "História Natural da Criação16:31 28/09/01, propôs uma sub-disciplina da zoologia que teria como objeto a totalidade do relacionamento entre uma espécie animal e seu meio ambiente orgânico e inorgânico. "A ecologia tornou-se tão controvertida quanto o é hoje no momento em que se decidiu incluir uma espécie muito particular de animal nas suas pesquisas - o homem".(2) Afinal, com essa inclusão, subjacente aos aspectos estritamente técnicos e científicos da ecologia, passou a ser discutido o próprio destino do homem. Pode-se afirmar que a ecologia, pela natureza globalizante de seu objeto, recolocou em cena, por outro ângulo, uma velha questão filosófica: a relação entre o ser e a consciência. A natureza teria sido feita para deleite ou castigo do homem? O homem é um filho comum da natureza entre os demais seres vivos? Qual a relação possível e desejável entre esses dois termos? São essas algumas indagações que rondam a ecologia, intrigam os curiosos e fascinam os convertidos.

         As implicações da ecologia, tal como ocorreu com a física moderna (Einstein), a biologia molecular (Monod) e a cibernética (Wiener), colocam indagações que não podem ser consideradas adequadamente no âmbito restrito das disciplinas especiais. As potencialidades que se produzem pelo alargamento das fronteiras teóricas, a par das novas alternativas práticas, condicionam uma reavaliação da própria totalidade humana. As novas interpretações filosóficas que nascem da práxis histórico-social estão, normalmente, articuladas aos novos problemas suscitados pelas ciências especiais ou ao surgimento de novas disciplinas científicas. Por outro lado, dialeticamente, os objetos das ciências nascem, evoluem e se transformam, também, sob o influxo das concepções filosóficas. Estas, ao mesmo tempo que dialogam com as ciências particulares para pensar a totalidade, constituem os pressupostos universais das ciências particulares.

         No entanto, essa dialética entre a filosofia e as ciências não pode ser reduzida apenas a dois pólos. Embora a luta de classes, em suas determinações políticas, ideológicas e teóricas não possa explicar tudo o que se passa no plano da consciência social, ela forma uma dimensão constituinte dessa consciência e da lógica de seu desenvolvimento.

         Se é verdade que as concepções teóricas possuem uma relativa autonomia e certa legalidade própria, já que a práxis que elas procuram interpretar apresenta um sentido que pode ser considerado objetivamente (pois esse sentido é a própria objetivação), seria um reducionismo inadmissível tentar explicar a essência de tais concepções pela simples referência às contradições políticas. Mas é ingenuidade supor que é possível decifrar e compreender a essência das concepções teóricas sem remeter aos fundamentos historicamente condicionados da consciência social, ou seja, aos interesses políticos contraditórios e suas expressões ideológicas. Estas manifestam a própria realização da consciência social em sua conexão com os momentos da práxis concretamente considerados. A luta de classes, em todas as sociedades divididas entre oprimidos e opressores, é a dimensão estruturadora da unidade dessas contradições que estão presentes em todos os níveis da consciência social, à medida que são oposições produzidas pelos homens no mundo dos próprios objetos.

         é reconhecendo esse caráter organizador e direcionador da ideologia, intimamente ligado à política enquanto disputa efetiva em torno das alternativas colocadas pela práxis, que se torna imperativo considerar que as concepções mais gerais não decorrem exclusivamente da soma das verdades científicas particulares. As filosofias, por mais que queiram apresentar-se com a linguagem emprestada das ciências que as inspiram, como se fossem soluções neutras e objetivas para os grandes problemas humanos, nunca nascem como fruto legítimo da árvore da ciência. Elas são, sobretudo, fruto impuro da vida.

         A ciência moderna colocou problemas inusitados para a filosofia. O "racionalismo crítico" de Popper, que pretende estar solidamente alicerçado na ciência contemporânea, formula uma epistemologia que parte da relação imediata entre o evento e seu enunciado e, como não poderia deixar de acontecer, chega a conclusões agnósticas. Por isso, caracteriza-se como uma das variantes do neopositivismo contemporâneo, mesmo que ele renegue furiosamente essa classificação. Popper afirma que podemos saber com certeza aquilo que não é verdade, mas nunca poderemos saber se realmente é verdadeiro o que tomamos provisoriamente como tal. As teorias são adaptações provisórias ao mundo, o qual permanecerá sempre objeto de uma progressiva manipulação e, ao mesmo tempo, em sua essência, uma incógnita insolúvel. Desse princípio ele acaba extraindo a legitimidade da violência do Estado burguês para proteger-se da subversão.(3) Quer dizer, mesmo colocando a verdade do mundo entre aspas, Popper é incisivo ao oferecer sua receita para resolver os problemas agudos da luta de classes. é difícil, mesmo fazendo uma regressão minuciosa, ver nas concepções de Popper apenas premissas epistemológicas neutras para orientar os cientistas na busca do conhecimento objetivo. Sem dúvida, há mais coisas entre a filosofia e a ciência do que pode declarar sua vã epistemologia.

         A cibernética e a informática trouxeram, igualmente, novas indagações para a filosofia. Norbert Wiener foi o primeiro a tentar extrair algumas conclusões filosóficas e políticas desse campo de pesquisas.(4) Suas conclusões foram tão liberais e impotentes quanto suas próprias idéias políticas. Mais recentemente, a chamada "teoria geral dos sistemas" - que tem em Walter Buckley um de seus defensores - procurou formular os pressupostos de uma sociologia baseada na semelhança entre os homens e as máquinas de informação.(5) As concepções de Buckley levam a uma dissolução da especificidade humana e transferem o papel crítico da consciência para os tecnocratas capazes de manipular cientificamente o "sistema social".

         Quando Jacques Monod propõe o "postulado da objetividade", cavando um fosso intransponível entre a ética e o conhecimento, com base nas suas importantes descobertas no terreno da biologia molecular, ele se ergue num vôo filosófico que os experimentos em laboratório podem sugerir ou inspirar, mas certamente não sustentam sozinhos.(6) A filosofia, como síntese mais abrangente da totalidade da relação do homem com o mundo, pela via das ciências, busca canais específicos e sistemáticos com a objetividade, mas a própria estrutura dessa relação é acionada pela ideologia. As disciplinas científicas são formas determinadas de pensar aspectos dessa relação e não o seu todo. Em outras palavras, as ciências estão contidas no interior da relação dos homens com o mundo e não o contrário. Assim, a filosofia, ao pensar essa relação global, não pode ser científica, pois ela indaga o objeto e suas determinações ao mesmo tempo que evoca o sujeito e suas indeterminações.

Ecologia e ecologismos

         Essa introdução foi necessária para justificar, prevenindo possíveis objeções, uma abordagem analítica da ecologia tal como se apresenta hoje, com seu objeto tão vasto e tão vago quanto os discursos que ela promove. Sobretudo, para separar os problemas técnicos e científicos sobre os quais ela se debruça, das receitas filosóficas, econômicas e políticas que - pela globalidade das implicações - ela se vê forçada a oferecer. Numa palavra: para distinguir a ecologia (enquanto problemática real) dos diversos "ecologismos" que ela suscita. Nessa perspectiva, assumindo compromissos ideológicos declarados e pressupostos filosóficos explícitos com base numa visão marxista não-dogmática, levantar alguns pontos de crítica a certos ecologismos, apontando sua contigüidade com as premissas da ideologia burguesa. De outro lado, pretende-se sugerir que o marxismo deve alargar-se para incorporar a problemática ecológica e contextualizá-la na perspectiva revolucionária. Não apenas como crítica ideológica anti-capitalista. Antes, como redimensionamento da sua visão sobre o homem e das possibilidades colocadas pela práxis. No entanto, alargar-se para o marxismo não pode significar um passo atrás, ou seja, não pode significar um retorno ao "humanismo naturalista" cujo pressuposto é a idéia de uma harmonia original que teria sido rompida em algum ponto da história. Ao contrário, inspirado nas questões levantadas pela ecologia, o marxismo deve buscar o rompimento com os liames que ainda o prendem ao naturalismo. Para tanto, deve começar por reconhecer que a harmonia com a natureza, a rigor, pressupõe ou propõe o "não-homem". A idéia básica do conceito de harmonia é a de conformidade ou regularidade, isto é, a noção de contigüidade e não-contradição com a natureza. O homem, embora originário e ligado de modo insuperável com a natureza, é uma profunda contradição com ela. O meio ambiente do homem é uma natureza radicalmente humanizada e regulada por sua própria ação e vontade. Desse modo, pelo prisma marxista, as questões ecológicas devem ser vistas não como ruptura de uma harmonia entre o homem e a natureza, mas como imposição da harmonia natural sobre o homem em detrimento da harmonia humana sobre a natureza. A imposição da harmonia humana sobre a natureza implica numa apropriação progressiva que, cada vez mais, tem como condição mesma de sua efetividade a conquista de um equilíbrio global consciente. A auto-regulação da coletividade humana em suas relações com a natureza, tendo em vista critérios globais de médio e longo prazo, realiza a essência da apropriação em sentido filosófico. Os ecologistas tendem a considerar a apropriação da natureza pelo homem como um aspecto da preservação, quando se trata exatamente do inverso. Os mares não podem ser envenenados, a atmosfera não pode ser poluída e nem esgotados os recursos naturais não-renováveis porque isso produz efeitos naturais não controlados que desumanizam nosso ambiente. Enfim, a imposição da harmonia humana sobre o mundo natural é, essencialmente, o conteúdo do trabalho social. A preservação é um aspecto dessa apropriação e o equilíbrio não é um fim, mas seu critério e condição. Nesse sentido, o automatismo das forças produtivas, que atinge seu ápice sob o capitalismo, deve ser condenado e submetido pelo sujeito humano não pelo seu caráter de força produtiva, mas pelo seu caráter de força destrutiva.

         Os movimentos ecologistas estão situados num largo espectro de posições políticas, que vão desde a extrema direita (Clube de Roma) até, supostamente, a extrema esquerda (Castoriadis e outros). Estes últimos são chamados "eco-socialistas" ou adeptos do "ecologismo libertário". Quase todos situam-se como "pós-marxistas" e apresentam como pontos comuns o combate à chamada "sociedade industrial", propondo uma nova civilização baseada fundamentalmente em formas inter-pessoais de relacionamento entre os homens. Não vamos tratar aqui dos movimentos explicitamente conservacionistas ou naturalistas e sim do movimento denominado Ecologismo, que vem se constituindo como um "projeto político de transformação social, calcado em princípios ecológicos e no ideal de uma sociedade não opressiva e comunitária". (7) Conforme seus adeptos, "o Ecologismo nasce da percepção de que a atual crise ecológica não se deve a defeitos setoriais e ocasionais no sistema dominante mas é conseqüência direta de um modelo de civilização insustentável do ponto de vista ecológico".(8) O ponto de partida, então, é a contradição entre a civilização humana, considerada em termos genéricos, e suas relações com a natureza. E dele se deduz mais do que uma simples doutrina: "O Ecologismo não é uma doutrina, mas sim uma atitude de vida. Uma busca construtiva de transformar para melhor a vida dos homens e o seu relacionamento com a natureza. Ele é um projeto político e filosófico novo, que só muito recentemente começou a delinear com mais clareza seus objetivos".(9) Tais objetivos, no entanto, são tão abstratos e genéricos quanto suas premissas filosóficas. A grandiloqüência da denúncia que se abate sobre toda a civilização atual transforma-se numa pregação Franciscana: "Através da ecologia, por exemplo, muitas pessoas estão sendo levadas a questionar o seu trabalho, o seu consumo, o seu lazer, a sua saúde, os seus relacionamentos e a sua visão do mundo".(10) Por outro lado, os métodos que propõe para essa gigantesca tarefa de modificar radicalmente o mundo parecem bastante suaves: "a solução real para a grande crise que vivemos não poderá surgir de cima para baixo mas terá de nascer da iniciativa, da criatividade e da solidariedade dos homens comuns".(11) Na verdade, a concepção dos ecologistas, embora não possa ser explicada exclusivamente pelas idéias que existiram no passado, não é tão nova quanto eles próprios imaginam. Mais do que uma simples inspiração no anarquismo, as idéias dos ecologistas estão profundamente comprometidas com os pressupostos filosóficos burgueses que floresceram no século XVIII e condicionaram as concepções anarquistas no século X IX até a metade do século XX. Vislumbremos um pouco essas raízes do passado.

Tudo começou com Rousseau

         Com as exceções notáveis de Saint-Simon, Owen e Fourier - que de alguma forma ligam suas concepções à idéia de progresso e, por isso, em muitos aspectos são precursores do socialismo marxista - a maioria das utopias contra a propriedade teve uma acentuada dimensão retrógrada. Já nasciam condenadas pelo futuro, pois não se situavam na perspectiva do desenvolvimento das forças produtivas, o que só o marxismo conseguiu fazer integralmente e, até, em certo sentido, exageradamente. Passada sua função de crítica metafórica ao presente, os modelos utópicos tornavam-se simples objetos de curiosidade ou interesse exótico. Nessas utopias, certos temas são repetitivos e constantes: "a fé na bondade natural do homem, a superioridade moral do 'estado selvagem' sobre o 'estado civilizado', o papel corruptor da vida em sociedade, o sonho da comunidade de bens e a supressão radical da propriedade privada, o primado da religião natural sobre as religiões reveladas e os dogmas. . .".(12) São temas comuns às obras de Thomas More (A Utopia, séc. XVI), Tommaso Campanella (A Cidade do Sol, séc. XVII), Jean Jacques Rousseau (Discurso sobre a origem e o fundamento da desigualdade entre os homens), Mably, La Bretonne, Morrelly, Dom Deschamps e outros, todos no século XVIII.

         A obra de Rousseau, que pode ser considerada como representante da ala esquerda da pequena-burguesia francesa na época da Ilustração, demonstra nitidamente o caráter progressista e ao mesmo tempo ambíguo do pensamento burguês. Rousseau criticou duramente o feudalismo e o despotismo, defendeu a democracia liberal e a igualdade jurídica entre os homens. "O Rousseau revoltado e anarquizante das primeiras obras volta-se totalmente para o mito da sociedade primitiva, perfeita e feliz. Sabe-se, por exemplo, que, no Discurso sobre as ciências e as artes (1750), ele foi a ponto de denunciar as desvantagens das ciências e das técnicas, das artes e do progresso em geral." (13) Depois, afasta-se da idéia de uma comunidade de bens e transforma-se num reformista, propondo um novo "estado de sociedade" capaz de reencontrar a felicidade perdida. No Contrato Social, Rousseau é um republicano que defende uma sociedade de artesãos e pequenos camponeses. Nesse período, ele já afirma que o "contrato social" é um recurso analítico e que o "estado selvagem" é uma suposição abstrata, não obstante continue raciocinando nos termos desse contrato. "Suponho aos homens - diz Rousseau - terem chegado a um ponto em que os obstáculos que atentam à sua conservação no estado natural excedem, pela sua resistência, as forças que cada indivíduo pode empregar para manter-se nesse estado. Então este estado primitivo não pode subsistir, e o gênero humano pereceria se não mudasse seu modo de ser". (14) O pensamento burguês partia dessa abstração, seja considerando essa situação verossímil ou apenas como ponto de partida teórico-analítico. De qualquer modo, a sociedade era percebida como uma soma de indivíduos, e estes como depositários de uma essência humana plenamente determinada. Rousseau não foi o primeiro, mas sua evolução sintetiza o impasse do pensamento burguês e de seus possíveis desdobramentos.

Anarquistas graças a Deus?

         O inglês Willian Godwin, pastor calvinista que viveu na segunda metade do século XVIII, grande admirador de Rousseau, é considerado o precursor do anarquismo moderno. Godwin recusa qualquer limitação da autonomia dos indivíduos. O Estado, o direito e as instituições criam sistemas opressivos que forçam as pessoas a renunciar ao seu próprio julgamento. O mesmo acontece com a propriedade, que tanto aliena os pobres como os ricos, ao impedir a dedicação aos prazeres do espírito. No futuro, o Estado desaparecerá e, com ele, todas as más inclinações da humanidade. Será o triunfo da razão, que guiará naturalmente os homens no sentido do interesse geral. Godwin defende a organização da sociedade em pequenas comunidades sem ligações estruturadas, nas quais todos trabalhariam pouco e com alegria, dividindo os bens de modo igualitário. As questões que ultrapassassem os limites das comunidades seriam regulamentadas por assembléias com poderes limitados.

         Esses traços da concepção de Godwin serão encontrados no pensamento de quase todos os anarquistas. "A despeito de Rousseau não ser o primeiro escritor a esboçar o conceito do nobre selvagem, é evidente que os anarquistas receberam principalmente dele sua predileção pelo homem pré-civilizado. (. . .) Essencialmente, os anarquistas acreditam que se o homem obedecer às leis naturais da sua própria espécie, será capaz de viver em paz com seus semelhantes". (15) Além disso, como acrescenta o autor citado, de Proudhon em diante, os anarquistas foram influenciados de várias maneiras pelos socialistas utópicos, principalmente por sua noção de pequena comunidade como base da sociedade. A própria distinção entre o anarquista e o utopista, proposta por Woodcock, indica certa dificuldade em estabelecer uma linha demarcatória:

         "O anarquista se recusa a ser dirigido pelo passado e aceita a conseqüência desta recusa. Ele não espera que o futuro seja determinado pelo presente e por isso não se pode identificar o anarquista com o utopista. A característica essencial do pensamento utópico é a criação de uma sociedade ideal, além da qual não haverá nenhum progresso, nenhuma mudança, porque o ideal é, por definição, perfeito e, portanto, estático". (16)

         Há, sem dúvida, uma certa distinção entre o socialismo utópico e o anarquismo. Mas o fato deste último recusar a descrição de um modelo definitivo e ao mesmo tempo negar-se, ao nível do discurso político, a propor um retorno explícito ao passado é exatamente aquilo que deve ser explicado. Se a matriz teórico-filosófica de ambos é a mesma, as condições sociais que estão na raiz do anarquismo são diferentes. Desde Thomas More até Robert Owen os socialismos utópicos surgem como um protesto contra o mercantilismo ou o capitalismo nascente, sempre do ponto de vista da ação das classes dirigentes ou de alguns benfeitores iluminados. O anarquismo, que aparece como movimento de massa no século XIX, já expressa uma fratura interna à sociedade burguesa. é um movimento politicamente anti-burguês, pois embora em várias de suas versões condene a ação política tradicional, identifica sempre o Estado como seu inimigo. Mas exatamente porque tem suas raízes sociais nos artesãos em processo de proletarização e nos camponeses pobres, o anarquismo vê o capitalismo "de fora", o que leva a uma sublimação do Estado como síntese de todos os males dessa sociedade e não como um instrumento de opressão de classe.

         Para Proudhon, a idéia de governo nasceu da família e da experiência doméstica. As revoluções sempre fracassaram porque não conseguiram romper com a idéia de governo. Ele propõe a lei suprema do contrato como forma de superação do governo, da autoridade e da opressão. Com a participação direta de cada um, sem delegação de qualquer espécie, realiza-se a supressão do governo. (17)

         E, mais adiante, critica o próprio Rousseau, que teria corrompido a idéia de contrato: "O século XVIII, creio tê-lo estabelecido superabundantemente, se não tivesse sido desencaminhado pelo republicanismo clássico, retrospectivo e declamatório de Rousseau, chegaria, pelo desenvolvimento da idéia de contrato, isto é, pela via jurídica, à negação do governo." (18) Realmente, o conceito de contrato levado às suas últimas consequências lógicas desemboca no anarquismo. é o ideal republicano e a sensatez conformista que levam Rousseau a admitir: "Um corpo intermediário estabelecido entre os súditos e o soberano, para sua mútua correspondência, encarregado da execução das leis e da conservação da liberdade, tanto civil como política." (19)

         Para Bakunin, assim como para Proudhon o pressuposto da igualdade, da justiça e da liberdade, enquanto valores, decorre, simplesmente, da observação racional do homem. A sociedade deve organizar-se como "associação livre" em comunas autônomas. Nos dois casos, parte-se da percepção dos indivíduos isolados na sociedade civil. é por isso que se pode afirmar que o anarquismo é o racionalismo burguês levado às suas conseqüências extremas. Tomando como ponto de partida o indivíduo na sua independência formal dentro da sociedade capitalista e considerando a igualdade abstrata de sua natureza, o anarquismo propõe a igualdade na sociedade real.

         O anarquismo projeta o ideal pequeno-burguês no contexto teórico do pensamento filosófico da burguesia ascendente, tomando como referência fundamental o "cidadão livre" que o capitalismo produziu como ficção jurídica. A fratura social e política que ficou claramente exposta no século XIX, a tomada de consciência desse fenômeno no plano da consciência social, desdobrou a crítica abstrata do socialismo utópico em duas novas vertentes de crítica teórica e prática: uma que rompe com o racionalismo abstrato e o humanismo burguês e planta uma semente realmente nova (Marx); outra, que deduz do próprio racionalismo burguês uma crítica genérica contra o capitalismo e uma guerra implacável contra o Estado em si mesmo. Enquanto o anarquismo extrai as conseqüências lógicas do individualismo burguês, o próprio capitalismo extrai suas conseqüências econômicas e sociais através da monopolização e da exploração crescentes. No fundo, o anarquismo busca algo impossível: quer superar a oposição entre os ideais burgueses e a realidade do capitalismo, tentando implantar efetivamente aquilo que no pensamento burguês é apenas um projeto abstrato cuja função é legitimar a exploração capitalista. Esse é o problema central do anarquismo: quer destruir a sociedade capitalista a partir dos pressupostos teóricos e filosóficos da própria burguesia. Tal como Feuerbach, que parte da percepção dos indivíduos isolados na sociedade civil, da essência humana concebida "como 'espécie', como generalidade interna, muda, que se limita a unir naturalmente os muitos indivíduos" (Marx), Bakunin também chega a uma espécie de religião da humanidade:

         "Substituindo o culto de Deus pelo respeito e o amor da humanidade, declaramos a razão humana como critério único da verdade; a consciência humana como base da justiça; a liberdade individual e coletiva como criadora da ordem da humanidade." (20)

O peso de uma herança

         A herança do pensamento filosófico burguês marca profundamente o anarquismo e condiciona suas insolúveis contradições. Seus maiores teóricos e militantes saíram do meio dos grandes proprietários rurais, da aristocracia decadente, dos artesãos (especialmente sapateiros e tipógrafos) ou foram seminaristas, e viam o capitalismo como degradação absoluta. O anarquismo é profundamente moralista e tende sempre a criticar a riqueza em geral e não apenas sua distribuição injusta. O anarquismo vê a si próprio como a manifestação dos anseios naturais do ser humano, enquanto que as instituições autoritárias e as relações de desigualdade seriam aberrações temporárias. Como diz Woodcock, "as várias escolas anarquistas estão unidas por uma série de suposições comuns, que constituem o núcleo da filosofia anarquista, a começar pela visão naturalista da sociedade". (21) No entanto, esse naturalismo não pode ser compreendido no sentido do "naturalismo histórico", tal como a visão stalinista interpreta o marxismo, supondo um processo de autoconstrução regido por leis idênticas às leis naturais. Trata-se, como já foi por demais sublinhado, do antropocentrismo, do humanismo racionalista e abstrato, do jusnaturalismo.

         A primeira das contradições do anarquismo é sua própria indefinição de sentido no tempo histórico, "pois na sua atitude com relação ao desenvolvimento social, o anarquismo parece flutuar como o caixão de Maomé, suspenso entre os pólos magnéticos do passado e do futuro, ambos igualmente idealizados".(22)

         Em função disso, o anarquismo torna-se ambíguo até mesmo com relação à igualdade social e à propriedade privada. é o que se percebe na afirmação de Bakunin: "A igualdade econômica e social não implica também o nivelamento das fortunas individuais, enquanto produtos da capacidade, da energia produtiva e da economia de cada um." (23) Ora, mesmo teoricamente, a realização dessa "desigualdade por merecimento" só seria possível numa sociedade de artesãos e produtores individuais, nunca no capitalismo da grande indústria e da radical divisão do trabalho. E assim mesmo implicaria numa contradição ética, pois seria legitimar a desigualdade e a pobreza surgidas com base na diferença de força física, inteligência, talento ou sorte. O pressuposto do individualismo demonstra aqui alguns de seus desdobramentos econômicos e sociais. A utopia anarquista, desse modo, não realizaria mais justiça do que aquela existente numa comunidade de pequenos proprietários (ricos e pobres) ou entre os artesãos talentosos e os menos hábeis. Noutra passagem, Bakunin é explícito: "A liberdade de cada indivíduo maior, homem ou mulher, deve ser absoluta e completa (. . .) liberdade de viver, seja honestamente pelo seu trabalho, seja explorando vergonhosamente a caridade ou a confiança privada, desde que esta caridade e esta confiança sejam voluntárias e só lhe sejam proporcionadas por indivíduos maiores." (24) Quer dizer, mesmo a exploração vergonhosa é admitida, desde que seja "voluntária".

         No entanto, o aspecto mais importante e que nenhum anarquista conseguiu abordar adequadamente é o problema da superação das relações mercantis, enquanto relações humanas economicamente condicionadas. A universalização das relações de produção capitalistas e a sua organicidade a nível nacional e internacional situam a mercadoria como uma relação global objetivamente condicionada. Uma simples "mudança de mentalidade" entre os homens não ofereceria critérios para a complexa e ampla circulação dos produtos. Inevitavelmente, a aplicação do modelo anarquista de sociedade, através das suas comunas autônomas e da posse privada da terra pelos produtores individuais, conduziria não só a um imenso retrocesso material como, também, a um retorno ao mercantilismo.

Indivíduo, Povo e Estado

         à medida que tomam o racionalismo abstrato como pressuposto filosófico e assumem uma postura ambígua sobre a propriedade, os teóricos do anarquismo geralmente opõem os grandes proprietários (os ricos) ao "povo". Este é constituído, não por determinadas classes com potenciais políticos historicamente condicionados, mas por todos os indivíduos que se sentem explorados e oprimidos. O pressuposto metafísico do indivíduo isolado não pode admitir as determinações concretas da classe social no sentido marxista. Frente a essa soma de entidades individuais abstratas chamada "povo", o Estado aparece como síntese absoluta da contradição, embora preserve os interesses dos ricos em geral.

         Nesse sentido, não é de estranhar que o problema da vanguarda sempre tenha sido, para os anarquistas, paradoxal. Tal paradoxo expressa as contradições do individualismo. Entre a necessidade prática de uma vanguarda organizada e o princípio radical da autonomia dos indivíduos, nunca conseguiu chegara uma síntese coerente. Acabou sempre caindo num dos extremos: ou o centralismo rigoroso, místico e dogmático (Bakunin), ou o culto do puro espontaneísmo (na maior parte dos casos). Malatesta, adepto do "comunismo anarquista", talvez tenha sido quem mais se destacou tanto pela coerência de suas posições políticas como pela tentativa de equacionar sensatamente as contradições do anarquismo. Para realizar essa façanha, Malatesta viu-se obrigado a sustentar uma concepção estritamente praticista:

         "Pode-se ser anarquista independentemente do sistema filosófico preferido. Há anarquistas materialistas e espiritualistas, monistas e pluralistas, agnósticos e outros que, como eu, sem prejulgar os possíveis desenvolvimentos da inteligência humana preferem declarar-se simplesmente ignorantes na matéria." (25)

         A sinceridade ou a modéstia de Malatesta não resolvem as questões sucitadas. Em qualquer circunstância, de forma aberta ou velada, consciente ou inconscientemente, uma postura ética e um sistema de idéias políticas envolvem sempre certas premissas filosóficas.

O egoísmo sincero

         Se o anarquismo aparece como uma dedução extremada do pensamento revolucionário da burguesia, ninguém foi mais extremadamente sincero que Max Stirner. Foi ele quem levou às suas últimas conseqüências as deduções teóricas do anarquismo. Ou melhor, foi quem levou as conseqüências às suas últimas premissas: um hegelianismo às avessas.

         Stirner partiu de Hegel para situar, numa inversão simétrica, o absoluto na individualidade absoluta. (26) Talvez, em virtude de um compreensível constrangimento, a maior parte dos anarquistas sempre colocou Stirner um pouco à margem. Ao propor a "guerra de todos contra todos", ou seja, a barbárie como forma de realização do ideal libertário, ele expõe algumas das raízes íntimas mais submersas dessa concepção. Ele chega, na teoria, ao ponto de onde o capitalismo parte na prática. Max Stirner abandonou a idéia do "bom selvagem" enquanto ponto de partida, para adotar a tese de que a "bondade" deve nascer como produto da "selvageria". As potencialidades egocêntricas estão submersas pelas instituições e, se liberadas, conduzirão, necessariamente, à potencialização dos indivíduos singulares na forma de uma "União dos Egoístas". No livro O único e sua propriedade (1844), Stirner fazia a apologia do eu "egoísta", critério da verdade e do valor, em oposição aos conceitos de Homem, Deus, Idéia e Hierarquia.

Da ecologia à utopia

         Os ecologistas reconhecem uma dívida para com os anarquistas, mas resgatam apenas uma parte dela:

         "Existe, por exemplo, nas propostas atuais dos ecologistas, uma forte influência da corrente não violenta do pensamento anarquista (Pierre Proudhon, Pietor Kropotkin, Paul Goodman, Herbert Head, etc.)" (27)

         O gigantesco desenvolvimento do capitalismo nos últimos quarenta anos (a partir da II Guerra), o aceleramento do processo de internacionalização e integração da economia mundial, a inserção progressiva das massas componesas no âmago desse sistema, a supressão crescente da autonomia dos trabalhadores individuais urbanos e o conseqüente desaparecimento da ideologia tradicional dos artesãos, configuram as condições histórico-sociais do sepultamento do anarquismo clássico. A ampliação das "novas classes médias" - especialmente dos intelectuais assalariados - e as novas contradições do capitalismo monopolista, entre elas o agravamento sem precedentes da crise ecológica, condicionam o surgimento do Ecologismo

         "A característica marcante do neo-anarquismo que emergiu na Inglaterra e Estados Unidos no pós-guerra, assim como outros movimentos de protesto, foi a de que representou, principalmente, uma tendência entre os jovens e especialmente dos jovens de classe média. Em 1962, no começo da ascensão, o jornal anarquista britânico Freedom realizou uma pesquisa das profissões e origens de seus leitores. Movimentos anarquistas passados compunham-se principalmente de artistas e camponeses, com poucos líderes intelectuais recrutados na inteligentzia das classes média e alta. A pesquisa do Freedom revelou que, na Inglaterra dos anos 60, apenas 15% dos anarquistas dispostos a responder questões sobre si mesmos pertenciam a tradicionais grupos camponeses e operários: dos restantes 85%, o maior grupo consistia de professores e estudantes e havia ainda muitos arquitetos, médicos, jornalistas e pessoas trabalhando independentemente como artistas ou artesãos." (28)

         Essa pesquisa indica, provavelmente, o momento da transição, quando amadureciam as condições sócio-políticas para que o Ecologismo surgisse como herdeiro do anarquismo. O mesmo autor ainda complementa que o "novo libertarismo" tem sido essencialmente uma revolta, não dos menos privilegiados e certamente não dos trabalhadores habilitados, os quais estão ocupados em defender suas recentes conquistas quanto ao padrão de vida, mas sim dos privilegiados que não aceitam a futilidade da riqueza como sua meta de vida.

         Sabemos, evidentemente, que a "futilidade da riqueza" é recusada por esses segmentos não por uma simples conversão, mas porque esta é, em geral, produto de uma impossibilidade objetiva. Trata-se, utilizando conceitos de Pierre Bourdieu, do habitus de classe, que tem a propensão de manifestar "a necessidade feita virtude". Essa dupla impotência, de um lado para ascender socialmente enquanto burguês, de outro para modificar o mundo de maneira puramente intelectual e afetiva, conduz o Ecologismo por discursos sombrios e pessimistas:

         "Em nossos dias, os utopistas evitam dar-nos uma visão de um futuro maravilhoso. Trata-se, em geral, de conter o crescimento, limitar os efeitos do que se chamou de 'choque do futuro'. O discurso utópico fala menos, hoje, de libertação, de abundância ou simplesmente felicidade do que de poluição, de ecologia, de 'socialismo da sobrevivência', como se o progresso fulgurante da humanidade realizado desde há alguns anos, tivesse acabado por assustar as imaginações mais audaciosas. Há um tom novo, ousado, pessimista, que não encontrávamos no tempo dos pioneiros do socialismo". (29)

         Esse pessimismo produzido pela impotência dos segmentos intelectualizados das novas classes médias, de onde sai a maior parcela dos teóricos e militantes do Ecologismo, talvez esteja na base de um exercício teórico que o diferencia da tradição anterior. Na concepção otimista da burguesia ainda revolucionária, o "naturalismo" é a premissa para uma crença ilimitada nos poderes da razão humana, para o "humanismo racionalista". No Ecologismo, ao contrário, a abstração racionalista do indivíduo é o ponto de partida para o "homem natural" reencontrado. Essa rearticulação lógica de uma mesma ontologia, com inversão de sentido, manifesta certas tendências irracionalistas do Ecologismo que não existiam no anarquismo. Isso explicaria as características agnósticas, místicas e até obscurantistas que aparecem nitidamente no discurso ecologista.

Da utopia à manipulação

         O discurso pessimista dos ecologistas, que aparece num contexto ideológico e social determinado, não está destituí-do de certas premissas verdadeiras, embora não sejam aquelas com as quais o Ecologismo trabalha. O fim do mundo - exceto por uma possível guerra nuclear - certamente não vai ocorrer. A burguesia não vai tornar este planeta irrespirável e inabitável para si própria. As classes não se suicidam política ou ecologicamente. Por outro lado, é verdade que o planeta está se tornando irrespirável e inabitável para milhões e milhões de pessoas que, em virtude dessa situação, diminuem sua expectativa de vida, nascem deformadas, ficam doentes e inválidas ou simplesmente morrem envenenadas. Mas isso, desde que mantido dentro de certos limites que não afetem o bem estar dos capitalistas, em circunstâncias politicamente controláveis, pode significar até algo positivo para o sistema. Uma espécie de compensação "natural" para o desemprego crescente.

         A gravidade da crise ecológica, como indica Enzensberger no artigo já citado, tende a impor a questão para as grandes massas e transformá-la numa bandeira reivindicatória e política de primeira grandeza. Mas o "eco-socialismo" ou "ecologismo libertário", ao revestir-se da ideologia pequeno-burguesa (por situar-se no terreno filosófico da burguesia-, promovendo um humanismo abstrato e genérico e fazendo a apologia do "homem comum" - elidindo, portanto, a centralidade da luta de classes - está incapacitado de oferecer uma alternativa política efetiva. Assim, as tendências do capitalismo em manipular a crise ecológica em benefício de saídas autoritárias e fascistizantes - no sentido de que as "partes" (as massas) devem se submeter aos interesses da "civilização" (a burguesia) - não poderá encontrar no Ecologismo um enfrentamento adequado. O Ecologismo aparece como um aspecto da crise de civilização promovida pelo capital ao invés de ser seu contraponto, exatamente por situar como principal a contradição entre o homem e a natureza . A proposta do Ecologismo por "uma nova mentalidade", um "novo estilo de vida", transforma aquilo que no anarquismo era uma guerra moral contra o Estado num "moralismo reformista", isto é, numa domesticada "filosofia de vida". A filosofia abstrata da revolução torna-se a revolução abstrata da filosofia.

Os profetas do entardecer

         Vejamos, agora, de maneira muito sucinta, algumas idéias de certos teóricos do Ecologismo para demonstrar os pontos convergentes de suas concepções, em que pese a variedade e criatividade dos enfoques.

         O livro de René Dumont, "Utopia ou Morte", propõe uma rigorosa "igualdade entre a natalidade e a mortalidade, entre os investimentos e a depreciação". (30) Além disso, para evitar a poluição atmosférica, a navegação aérea será consideravelmente limitada. Para economizar energia, haverá um retorno à bicicleta e o incremento da navegação à vela. Dumont decide-se, claramente, pelo estancamento populacional e pela regressão das forças produtivas.

         Em Ivan Ilitch ("A Convivencialidade"), o tema da bicicleta retorna. O ex-padre, reitor da Universidade Católica de Porto Rico, defende como saída para a crise da civilização uma sociedade "convivencial" baseada em instrumentos que sejam dominados pelo homem ao invés de dominá-lo. O polêmico autor de "Sociedade sem escolas" e de "A expropriação da saúde" cita como exemplos de instrumentos convivenciais, além da bicicleta, a charrua de aço e o rolamento. Para chegar a essa sociedade, Ilitch profetiza o desmoronamento progressivo da "sociedade industrial" através da inversão de sentido do funcionamento das próprias instituições, sem a necessidade da subversão da ordem pela revolução. A contradição fundamental da sociedade não seria entre as classes, mas entre o homem e a máquina. Vencida esta última, teríamos o reino da alegria e da transparência. (31)

         "A sociedade convival é aquela onde os homens terão aprendido a viver dentro de certos limites, controlando seu consumo, dominando sua reprodução. é a que soube colocar o instrumento a serviço do homem. Isso supõe uma renúncia à produção em massa, a limitação do consumo mercantil, mas também a abolição de todas as hierarquias, as do dinheiro, dos diplomas do saber, e abolir igualmente todas as castas profissionais que impedem o livre acesso ao instrumento. A convivalidade deve ser o contrário da produtividade e da especialização. Suspenda-se a cadência industrial, exclama Ilitch, e o homem conhecerá modificações que apenas imaginamos. Serão determinados então os marcos críticos além dos quais o emprego dos instrumentos será prejudicial: isso pode significar a prescrição total dos transportes supersônicos se o espaço aéreo estiver ameaçado, ou a proibição total dos veículos automotores nas cidades." (32)

         A idéia da regressão tecnológica e industrial, das relações inter-pessoais como base da sociedade, das pequenas comunidades, comparecem nitidamente nas concepções de Ilitch. Mas, principalmente, está implícito o pressuposto do "homem natural" que foi soterrado pelo sistema técnico e institucional que o domina.

         O filósofo grego Cornelius Castoriadis, ex-marxista, que se notabilizou mundialmente por certas críticas pertinentes que faz ao marxismo, especialmente em sua versão stalinista (33) , tem uma relação ambígua com o Ecologismo. De um lado, Castoriadis acentua um aspecto que desagrada à maioria dos ecologistas: ". . . tudo o que dizemos sobre ecologia só toma sentido no contexto de um movimento muito mais amplo e muito mais profundo que visa a transformação radical da sociedade e para o qual a questão do poder não poderia ser posta entre parênteses".(34) De outro, descobre pontos de contato com sua proposta de uma "sociedade autônoma":

         "Aos meus olhos, o movimento ecológico apareceu como um dos movimentos que tendem para a autonomia da sociedade; e a cada vez que tive de falar dele, oralmente ou por escrito, eu o incluí na série destes movimentos de que falava há pouco. No movimento ecológico trata-se, em primeiro lugar, da autonomia em relação a um sistema técnico-produtivo, pretensamente inevitável ou pretensamente ótimo: o sistema técnico produtivo que está aí na sociedade atual." (35)

         Já vimos a centralidade que o conceito de autonomia, individual e coletiva (das comunidades auto-governadas), possuía no pensamento anarquista. Castoriadis procura recuperar filosoficamente esse conceito: "Para Castoriadis, a autonomia é diferente da liberdade abstrata encontrada, segundo este, até no pensamento marxista. A autonomia, no plano individual, é a possibilidade do domínio relativo do consciente sobre o inconsciente (do Ego sobre o Id, segundo Freud); no plano coletivo, é a possibilidade da auto-instituição da sociedade; a capacidade de uma coletividade assumir, em contraposição ao discurso do outro, o seu próprio discurso e um modo próprio de fazer o social." (36)

         A aproximação fundamental de Castoriadis com o Ecologismo se dá por um termo de mediação: sua simpatia por uma forma de neo-anarquismo e as relações deste com o Ecologismo. O ex-membro do grupo "Socialismo ou Barbárie", que renegou o socialismo em sua versão marxista, hesita agora em aderir à barbárie:

         "A luta antinuclear: sim, muito bem, bravo. Mas será que isto quer dizer ao mesmo tempo: luta antieletricidade? Em caso afirmativo, é preciso então dizê-lo imediatamente, alto e bom som claramente. (...) é preciso levar em conta que não há praticamente nenhum objeto da vida moderna que de um modo ou de outro, direta ou indiretamente, não implique a eletricidade. Essa rejeição total é talvez aceitável - mas é preciso sabê-lo e é preciso dizê-lo."(37)

         André Gorz, em seu livro cujo título é bastante sugestivo - "Adeus ao Proletariado" (38) -, talvez seja o autor mais preciso ao delinear sua utopia ecológica. Gorz constata que nos países de capitalismo avançado a classe operária industrial está diminuindo numericamente e, hoje, não passa de uma "minoria privilegiada". O contingente revolucionário seria a "não-classe" formada por aqueles que estão à margem do sistema. Essa idéia de uma revolução cujo potencial está à margem das relações capitalistas de produção ele retira, certamente, de Marcuse. Inspirado em Ilitch, Gorz aponta uma dualidade entre a "autonomia" e o trabalho socialmente necessário, a "heteronomia". Para ele, as possibilidades de humanização estão contidas no campo da autonomia, ou seja, nas relações humanas delimitadas no espaço e que podem ser definidas como interpessoais no sentido tradicional. A fonte da desumanização, que submete o indivíduo, é a universalidade do sistema material de produção. Mas Gorz admite que há uma contradição nisso, pois o sistema material de produção que cria a opressão não pode ser suprimido, já que seria um retrocesso em termos de certas conquistas materiais que não podem ser abandonadas. O que ele propõe é que as pequenas comunidades, nas quais se praticará a autonomia, mantenham sob controle o setor do trabalho necessário, a fim de que esse sistema não se desenvolva mais do que o estritamente indispensável.

         Como se percebe, o tema das comunidades, da autenticidade das relações interpessoais em oposição à inautenticidade da sociedade global, o pressuposto do indivíduo natural que se vê oprimido pelo aparato técnico e busca uma forma de regressão, também está presente nas concepções de Gorz. A fragilidade do esquema teórico apresentado é que o indivíduo singular é tomado como ponto de partida, e, como tal, é esmagado pela própria universalidade do humano. O que Gorz não compreendeu, embora Marx o indique, é que sendo o ponto de partida empírico da sociedade, o indivíduo é, também, historicamente um ponto de chegada. Isso quer dizer que a singularidade do humano deve ser recuperada, igualmente, na própria universalidade do aparato técnico e produtivo, em função das potencialidades materiais e espirituais produzidas nele. Do mesmo modo, a universalidade humana deve ser a base para o desenvolvimento da verdadeira singularidade. Partindo de uma oposição real engendrada pelo capitalismo, entre o indivíduo e a sociedade, Gorz reifica tanto um como outro, estabelecendo como oposição ontológica da vida social aquilo que só é antagonismo no terreno das relações de produção. Ora, se os indivíduos tiverem ao seu alcance uma centena de canais de televisão e, através da telemática, tiverem acesso a todos os bancos de informação do mundo, poderão cultivar muito melhor sua individualidade do que enterrados em sua pequena comunidade, olhando pela janela ou descascando arroz num pilão de madeira.

O relógio parado

         Após tantas flechas lançadas num combate supostamente justo chegou a hora, difícil, da autocrítica. Os marxistas, pelo menos a assustadora maioria, para usar uma expressão já consagrada, adotam a tática do relógio parado, que dá a hora certa duas vezes por dia, no que tange às questões teóricas. Se estamos certos "em princípio" e quase todos os renegados abandonam, junto com a ortodoxia sagrada, o primado da luta de classes e a própria luta pela revolução, um dia a história vai recompensar nossa fidelidade perdoando nossos erros. é nesse tom, misto de autocomplacência e autosuficiência que, em geral, os marxistas respondem às indagações "diabólicas" que nascem constantemente do processo histórico.

         Portanto, é necessário advertir que as críticas sumariadas aqui buscaram, tão somente, demonstrar a existência de pontos comuns entre os "ecologismos libertários", o anarquismo e o socialismo utópico, todos formando uma linha de continuidade com base em premissas da filosofia burguesa do século XVIII. Nessa filosofia, em síntese, o indivíduo empírico surge como ponto de partido teórico. Quando, na verdade, é o indivíduo teoricamente compreendido (porque ele é o resultante da riqueza das determinações acumuladas pela práxis histórica) que deve servir como ponto de partida para compreender o indivíduo empírico. Essa incompreensão leva a propostas de humanização que tomam as relações inter-pessoais (sem mediações técnicas) como a única dimensão da autenticidade. A "autonomia", em conseqüência, é vista como um espaço que, de um modo ou de outro, está numa contradição não-dialética com a sociedade global. Disso resultam as teses de "auto-gestão", "auto-governo" ou "auto-instituição" de pequenas unidades sociais como antídoto da alienação. E assim, advêm as propostas mais ou menos abertas da regressão técnico-científica, da apologia do individualismo e a atribuição de importância secundária à luta de classes. Mas é inegável que autores como Castoriadis, Gorz e Dupuy (39) , por exemplo, em que pese suas posições políticas, colocam questões fecundas e pertinentes. Eles levantam indagações que, se é certo que não respondem de modo revolucionário, sequer podem ser respondidas por um simples "retorno aos clássicos". Vale referir, só a título de exemplo, uma das noções em voga entre esses autores: a autonomia. Essa expressão, inspirada diretamente no anarquismo, situa-se num campo teórico onde o marxismo deixou alguns pontos de interrogação: o problema do indivíduo, seu estatuto na ontologia do ser social, sua relação com a história e sua dialética no interior do coletivo. Não há dúvida que "os homens fazem sua própria história mas não a fazem como querem". Isso, que Marx nos ensinou, todos o sabemos. O que precisa ser respondido, hoje, é em que medida esse querer constitui, criativamente, a história que é feita. Marx nos diz apenas que os homens não fazem a história na medida do seu querer. Essa polêmica não é nova e, evidentemente, as contribuições de Lênin, Gramsci, Lukács, Kosik, Sartre e muitos outros devem ser consideradas e devidamente avaliadas. Mas, em se tratanto de filosofia, o tempo, por si mesmo, não é uma solução. As dívidas velhas também devem ser saldadas.

         O que se pretendeu indicar nessa crítica a alguns dos inspiradores do "ecologismo libertário" é que, diante das indagações oportunas que levantam, as soluções apontadas não se colocam como um avanço em relação à ruptura representada pelo marxismo, mas como um retorno a pressupostos pré-marxistas. Ao denunciarem o "naturalismo histórico" do marxismo, como já foi indicado, acabam adotando certas premissas do próprio "racionalismo naturalista" que o precede.

         Hoje, quem se debruça a pensar um pouco sobre o marxismo é obrigado a reconhecer, realmente, que foi pago um tributo elevado ao cientificismo do século XIX. A tese do comunismo como extinção do Estado, da política, do direito, da moral e da filosofia pressupõe uma universalidade reencontrada como harmonia social em si mesma solucionada. E o que é mais grave, essa tese significa a síntese para onde converge um legado de equívocos sobre a ontologia do homem. Nos textos de Engels a "tensão naturalista" (40) daí resultante é mais explícita e menos ambígua, o que é um demérito. Em Marx ela também está presente, embora a práxis de autoconstrução humana seja uma categoria mais incisiva e profunda no contexto de seu pensamento. Se essa tensão naturalista estivesse ausente em Marx não haveria possibilidade de convergência com Engels nos aspectos referidos acima. No entanto, o pensamento de Marx avança em direção a um rompimento radical com a tradição anterior, como o demonstram, por exemplo, as "Teses sobre Feuerbach". Trata-se de prosseguir no caminho desse rompimento, de ir mais adiante e não de retroceder ao humanismo abstrato que está na base dos chamados ecologismos libertários.

         A radicalidade da crise ecológica, posta efetivamente como crise da civilização que tem o capital como seu centro motor, a consciência dessa crise e de sua extensão, reafirmam, decisivamente, que o homem não é simplesmente um ser da natureza, pois sua essência é exatamente o processo de afastamento dessa primeira natureza e, nessa medida, de produção de sua natureza histórica enquanto humanização. Por isso mesmo, jamais poderá romper completamente os liames com a primeira natureza de onde partiu. Não será naturalmente (em qualquer dos sentidos dessa palavra), portanto, nem retrocedendo em relação à eficácia das mediações com o mundo, que poderá enfrentar a crise e superar-se. A questão da qualificação consciente das forças produtivas, da crítica teórica e prática das objetivações técnicas e científicas que expressam o particularismo histórico do modo de produção capitalista, deve ser feita desde já. O debate sobre uma auto-regulação desse processo, a partir de critérios mais abrangentes que a ciência e a técnica em si mesmas, também é uma questão urgente e decisiva. O marxismo deve avançar para ter condições de fazê-lo. Nesse ponto, os ecologistas, em certo sentido, estão à frente. Porém, os marxistas podem compreender algo que os ecologistas recusam por princípio: que o aparato produtivo gerado pelo capitalismo encerra uma unidade de contrários. A qualidade da ciência e da técnica geradas no capitalismo também encarna uma dialética da universalidade e da particularidade. E mesmo o taylorismo - embora isso deixe os ecologistas horrorizados - possui determinações potenciais de uma conquista humana universal, ao mesmo tempo que nasceu para promover a mais desumana e alienante exploração. Não se trata, então, de abolir a produção em massa, mas de estabelecer uma regulação consciente em cada momento histórico, tendo em vista o equilíbrio ecológico e as possibilidades técnicas e cientificas de mantê-lo e aperfeiçoá-lo. Em relação ao trabalho necessário, o sentido da humanização se desdobra em três caminhos complementares, mas que não apontam para a abolição do trabalho industrial e nem para um limite fixo em seu desenvolvimento: a recomposição do trabalho parcelar através da automatização, a melhoria do ritmo e das condições de sua execução, e a diminuição progressiva do tempo de trabalho. Essas três variáveis estão situadas no campo das potencialidades liberadas pelo próprio desenvolvimento do capitalismo, embora exijam uma redefinição, um redimensionamento e uma regulação conscientes como tarefas imprescindíveis da revolução proletária e da construção do socialismo.

         Não é a modorrenta aldeia da Idade Média nem a insípida comunidade rural do passado que devem nos servir de inspiração para construir o futuro.* é no mundo moderno mesmo, através dos computadores, dos meios eletrônicos de comunicação, do aumento progressivo do tempo livre, que hoje servem para nos oprimir, controlar e imbecilizar, que devemos procurar a base objetiva para um futuro que seja melhor e possível. Para que a igualdade social, a liberdade real e a autoconstrução consciente dos indivíduos seja, de fato, uma possibilidade concreta elevada ao coletivo. Caso contrário, nossas pequenas idiossincrasias ou comoventes "filosofias de vida" serão apenas um aspecto da própria crise de civilização que pensamos enfrentar, um subproduto da manipulação.

         A identidade de pressupostos filosóficos do Ecologismo com o anarquismo, o socialismo utópico e as concepções da burguesia em ascensão, é aquilo que condiciona as semelhanças ideológicas e políticas: a crítica moral à sociedade como um todo, sem priorizar o modo de produção; o método idealista de análise da sociedade, que concebe as transformações históricas como produzidas fundamentalmente no terreno genérico do processo "cultural"; a incompreensão sobre a luta de classes; desconhecimento ou subestimação do papel das vanguardas e a crença na ação espontânea (desde que sejam "convertidos") das próprias classes dominantes (socialismo utópico), do "povo em geral" (anarquismo) ou dos "homens comuns" (Ecologismo); o desprezo pela política tradicional; o culto das relações inter-pessoais e a apologia das pequenas comunidades; a condenação, aberta ou velada, em maior ou menor grau, do progresso material; enfim, o que foi dito por Woodcock sobre o anarquismo parece ter plena validade para o Ecologismo: ele flutua - "como o caixão de Maomé" - entre os pólos magnéticos do passado e do futuro, ambos igualmente idealizados.


Notas de Rodapé

1) ENZENSBERGER, Hans-Magnus. Uma Crítica da Ecologia Política. p.118
2) Ib., p.82
3) MAGEE, Mayan. As Idéias de Popper.
4) WIENER, Norbert. Cibernética e Sociedade: o uso humano dos seres humanos.
5) BUCKLEY, Walter. A Sociologia e a Moderna Teoria dos Sistemas.
6) MONOD, Jacques. O acaso e a necessidade.
7) LAGO, Antônio & Pádua, José Augusto. O que é Ecologia. p.15
8) Ib., p.36
9) Ib., p.38
10) Ib., p.11
11) Ib., p.12
12) PETITFILS, Jean-Cristian. Os Socialismos Utópicos. p.25-6
13) Ib., p.28
14) ROUSSEAU, Jean-Jacques. O Contrato Social. p.47-8
15) WOODCOCK, George. O Inimigo do Rei e do Estado Ainda Vive. p.125-6
16) Ib., p.124
17) PROUDHON. Textos Escolhidos. p.63
18) Ib., p.63
19) ROUSSEAU, Jean-Jacques. Op. cit., p.48
20) BAKUNIN. Textos Escolhidos. p.48
21) WOODCOCK, George. Anarquismo: Uma História das Idéias e Movimentos Libertários. p.19
22) Ib., p.21-2
23) BAKUNIN. Op. cit., p.59
24) Ib., p.50
25) Malatesta. Textos Escolhidos. p.33
26) WOODCOCK, George. Op. cit., p.81
27) Lago, Antônio & PÁDUA, José Augusto. Op. cit., p.40
28) WOODCOCK, George. Op. cit., p.136
29) PETITFILS, Jean-Cristian. Op. cit., p.182
30) Ib., p.172
31) ILITCH, Ivan. A convivencialidade.
32) PETITFILS, Jean-Cristian. Op. cit., p.177-8
33) CASTORIADIS, Cornelius. A Instituição Imaginária da Sociedade. (ver, especialmente, o capítulo I)
34) CASTORIADIS, Cornelius & CONH-BENDIT, Daniel. Da Ecologia à Autonomia. p.85
35) Ib., p.25
36) SCHERER-WARREN, Ilse. Movimentos Sociais. p.114-5
37) CASTORIADIS, Cornelius & CONH-BENDIT, Daniel. Op. cit., p.25-6
38) GORZ, André. Adeus ao Proletariado: Para Além do Socialismo.
39) DUPUY, Jean-Pierre. Introdução à Critica da Ecologia Política. (Esta obra não foi discutida aqui porque mereceria um tratamento à parte.)
40) GENRO FILHO, Adelmo. Introdução à Crítica do dogmatismo.
* Um dos resíduos do socialismo utópico no século XX é a clássica obra de Martin Buber. Ele critica o marxismo por não levar às ùltimas conseqüências a tese da "substituição do princípio político pelo social", que seria a proposta central do utopismo. Buber defende a Idéia de uma "reestruturação" do tecido social a partir da instituição prograssiva de novas relações inter-pessoais, com base nas cooperativas de produção, tomando como paradigma o caso de Israel. Seu misticismo religioso e sua apologia das relações sociais pré-capitalistas como "naturais", aparecem explicitamente. (BUBER, Martin. O Socialismo Utópico. São Paulo, Perspectiva, 1971.)


Bibliografia

1) BAKUNIN. Textos Escolhidos. Porto Alegre, L & PM, 1983. (Biblioteca Anarquista)
2) BUCKLEY, Walter. A Sociologia e a Moderna Teoria dos Sistemas. São Paulo, Cultrix/Editora da Universidade de São Paulo, 1971.
3) CASTORIADIS, Cornelius. A Instituição Imaginária da Sociedade. São Paulo, Paz e Terra, 1982.
4) CASTORIADIS, Cornelius & COHN-BENDIT, Daniel. Da Ecologia à Autonomia. São Paulo, Brasiliense, 1981.
5) DUPUY, Jean-Pierre. Introdução à Crítica da Ecologia Política. Rio de Janeiro, Civilização Brasileira, 1980.
6) ENZENSBERGER, Hans-Magnus. Uma Crítica da Ecologia Política. Belo Horizonte, Vega, 1978. (Col. Polêmica; l)
7) GENRO FILHO, Adelmo. Introdução à Crítica do Dogmatismo. In: Teoria & Política, nº 1. São Paulo, Brasil Debates, 1980.
8) GORZ, André. Adeus ao Proletariado: Para Além do Socialismo. Rio de Janeiro, Forense-Universitária, 1982.
9) ILITCH, Ivan. A Convivencionalidade. Lisboa, Edições Europa-América, 1976.
10) LAGO, Antônio & PADUA, José Augusto. O Que é Ecologia. 2.ed. São Paulo, Brasiliense, 1985. (Col. Primeiros Passos; 116)
11) MAGEE, Mayan. As Idéias de Popper. São Paulo, Cultrix/Editora da Universidade de São Paulo, 1974.
12) MALATESTA. Textos Escolhidos. Sel e Notas Grupo Anarquista Primeiro de Maio. Porto Alegre, L & PM, 1984.
13) MONOD, Jacques. O Acaso e a Necessidade.3.ed. Rio de Janeiro, Vozes, 1972.
14) PETITFILS, Jean-Christian. Os Socialismos Utópicos. São Paulo, Círculo do Livro, s.d.
15) PROUDHON. Textos Escolhidos. Porto Alegre, L& PM, 1983. (Biblioteca Anarquista)
16) ROUSSEAU, Jean-Jacques. O Contrato Social. Rio de Janeiro, Edições de Ouro, s.d.
17) SCHERER-WARREN, Ilse. Movimentos Sociais. Florianópolis, Editora da UFSC, 1984.
18) WIENER, Norbert. Cibernética e Sociedade: o uso humano dos seres humanos. 3.ed. São paulo, Cultrix, s.d.
19) WOODCOCK, George. Anarquismo: Uma História das Idéias e Movimentos Libertários. Porto Alegre, L& PM, 1983. (Biblioteca Anarquista, 1)
20) ___________ O Inimigo do Rei e do Estado Ainda Vive. In: Revista Oitenta, nº 2. Porto Alegre, L&PM, 1980.